“Fizeste-nos para Ti, e inquieto está o nosso coração,
enquanto não repousar em Ti.”
Agostinho, na sua mais conhecida obra, as Confissões, faz
essa bela e verdadeira declaração de plena realização em Deus. Para nós
cristãos, que fomos salvos e resgatados por Cristo da condenação eterna, não há
nada que traga mais paz aos nossos corações do que buscar e confiar em Deus,
não como um ser ausente, distante, mas, sim, presente, onde podemos repousar
com segurança.
Saber que fomos feitos por Deus, não para nossa própria
glória e satisfação, mas para Ele e Sua glória é motivo de muita alegria para
Seus verdadeiros filhos. Ao contrário do que podem pensar aqueles que não O
confessam como Senhor e Salvador de suas vidas que, por serem egoístas e
antropocêntricos, vivem para eles mesmos, e querem que tudo orbite ao seu
redor, glorificando-os; aqueles que foram comprados por um alto preço vivem com
um propósito absolutamente diferente.
Há um propósito determinado por Deus para a humanidade. O
homem tem um propósito singular nessa vida. E, ao contrário do que podem pensar
alguns, toda a humanidade está incluída nessa missão, até mesmo o ímpio. Sendo
assim, glorificar a Deus e gozá-Lo para sempre é seu fim supremo.
Essa resposta belíssima e bíblica encontramos na primeira
pergunta do Catecismo Maior de Westminster, e a pergunta é esta: Qual o fim
principal e supremo de homem? Resposta: o fim supremo e principal do homem é
glorificar a Deus e gozá-lo para sempre. Não há resposta mais bela e objetiva
do que a citada acima, não é mesmo? Eu e você fomos feitos para Ele e nossa
missão e glorificá-Lo e gozá-lo para sempre!
Baseando-nos nessa afirmação e nos textos que são utilizados
como base, observaremos quão bíblico e profundamente prazeroso é para o homem
viver para a glória do seu Criador.
É nosso dever glorificar a Deus porque tudo foi ou existe
para Ele
Observe o seguinte texto:
“Porque dele, e por meio dele, e para ele são todas as
coisas. A ele, pois, a glória eternamente. Amém!” (Rm 11.36)
Depois de ter contemplado o grandioso e maravilhoso plano de
Deus na redenção do Seu povo, Paulo conclui esse capítulo com um louvor a Deus
(vs. 33-36). No versículo 33, ele faz uma exclamação em louvor da sabedoria e
conhecimento de Deus. Willian Hendriksen comentando esse verso diz que “Paulo
está, provavelmente, refletindo em particular sobre as qualidades divinas como
reveladas no plano de redenção e na maneira como esse plano é concretizado. Ele
está certo do fato de que o caminho da salvação, decretado por Deus, e a
maneira como esta salvação é efetuada nas vidas humanas, ultrapassam tudo o que
os meros seres humanos poderiam jamais ter imaginado.”
Nos versos seguintes (vs.34-35), Hendriksen comenta que “o
autor enaltece a autossuficiência de Deus ou independência divina. Quem pode se
comparar com Deus? Quem, porventura, lhe comunicou alguma sabedoria ou
conhecimento, ou ajudou de alguma forma a originar e/ou concretizar o plano de
salvação? Com certeza, ninguém. Portanto, a glória pertence tão somente a ele.”
O versículo 36, a glória é dada somente a Deus, Àquele que
criou tudo pela Sua vontade soberana, através de Sua ação soberana e,
sobretudo, para Sua glória soberana! Calvino comentando este verso diz o
seguinte:
“O apóstolo nos mostra quão longe estamos de ser capazes de
vangloriar-nos, contra Deus, de algum bem que porventura seja propriamente
nosso, visto que fomos criados por Deus, a partir do nada, e agora o nosso
mesmo ser depende dele. Disto ele conclui ser justo que nosso ser seja orientado
para sua glória. Quão absurdo seria que as criaturas, a quem ele formou e
sustenta, possuíssem algum outro propósito que não fosse a manifestação da
glória de seu Criador!”
A totalidade de nossas vidas precisam ser curvadas à glória
de Deus. Não sendo dessa maneira, a glória de Deus é roubada. Por isso, devemos
glorificar a Deus em tudo o que fazermos.
Observemos o que diz o apóstolo Paulo em sua carta à Igreja
em Corinto:
“Portanto, quer comais, quer bebais ou façais qualquer outra
coisa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus.” (I Co 10.31)
Depois de tratar nos versículos anteriores da liberdade
cristã, do exemplo que os cristãos devem dar, não somente aos de fora da
comunidade cristã, mas também aos cristãos, ele no versículo 31 nos ensina um
princípio: o verdadeiro cristão não deve estar preocupado com o que é seu por
direito – comer, beber ou qualquer outra coisa –, mas, sim, sobretudo, com a
glória de Deus. A glória de Deus deve estar em primeiro lugar, e todas as
demais coisas, ou melhor, todas as coisas, devem estar em subordinação à sua
glória. Ele deve ser glorificado até nas pequenas coisas. Devemos nos submeter
à vontade revelada de Deus.
Deus nos ensina como O glorificar e como se alegrar nEle
Agora voltaremos nossos olhos para o que o salmista diz:
“Tu me guias com o teu conselho e depois me recebes na
glória. Quem mais tenho eu no céu? Não há outro em quem eu me compraze na
terra. Ainda que a minha carne e o meu coração desfaleçam, Deus é a fortaleza
do meu coração e a minha herança para sempre. Os que se afastam de ti, eis que
perecem; tu destróis todos os que são infiéis para contigo. Quanto a mim, bom é
estar junto a Deus; no Senhor Deus ponho o meu refúgio, para proclamar todos os
seus feitos.” (Sl 73.24-28)
O salmista nos ensina a observarmos as Escrituras, onde
estão contidos os conselhos e decretos de Deus e a termos nossos olhos voltados
para a glória eterna de Deus, pois dessa maneira O glorificamos. Deus quer que
Seus filhos estejam sempre desejosos de não só o glorificarem através de seus
atos e palavras, mas que também meditem, lembrem-se de Suas promessas e
desejem, ardentemente, estar unidos com Ele na Sua glória vindoura, a glória
eterna. Nada, absolutamente nada nesse mundo, poderia romper a segurança, paz e
comunhão entre o salmista e Deus.
O nosso destino é gozar a Deus em glória
No Evangelho de João, encontramos uma belíssima declaração
do nosso Senhor Jesus:
“A fim de que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e
eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste.
Eu lhes tenho transmitido a glória que me tens dado, para que sejam um, como
nós o somos; eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na
unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também
amaste a mim. Pai, a minha vontade é que onde eu estou, estejam também comigo
os que me deste, para que vejam a minha glória que me conferiste, porque me
amaste antes da fundação do mundo.” (Jo 17.21-24)
Jesus pede nessa oração que os cristãos, como igreja,
estejam unidos, não apenas numa unidade espiritual invisível, mas também numa
unidade visível no mundo para que o mundo creia nEle. E nos é deixado um padrão
de unidade que caracteriza o relacionamento do Pai com o Filho e entre o Filho
e os cristãos. Cristo deseja que seus discípulos vejam sua glória. E mais: que
também dela desfrute. Calvino mais uma vez nos será de grande auxílio:
“Cristo fala da felicidade perfeita dos crentes, como se
quisesse dizer que seu desejo não será satisfeito até que tenham sido recebidos
nos céus. De igual modo explico a contemplação da glória. Naquele tempo viram a
glória de Cristo, assim como uma pessoa fechada no escuro obtém, através de
pequenas frestas, uma luz tênue e sombria. Cristo então deseja que eles façam
um progresso tal que cheguem a desfrutar do pleno esplendor do céu. Em suma,
ele pede ao Pai que os conduza, por ininterrupto progresso, à plena visão de
Sua glória.”
Jesus, em todos os seus atos e obra, é a encarnação e
revelação da glória de Deus, e, como um Senhor misericordiosos, permite-nos
que, juntamente com Ele, desfrutemos de tão grande bênção!
Johannes Gerhard Vos, comentando a afirmação feita no
Catecismo Maior de Westmister, afirma:
“O componente mais importante do propósito da vida humana é
glorificar a Deus, ao passo que gozar a Deus está estritamente subordinado a
glorificar a Deus. Na nossa vida religiosa deveríamos colocar sempre a ênfase
maior no glorificar a Deus. Quem assim o faz irá gozar a Deus em verdade, tanto
aqui quanto no porvir. Mas quem pensa que pode gozar a Deus sem O glorificar
corre o risco de supor que Deus existe para o homem, e não o homem para Deus.
Enfatizar o gozar a Deus mais do que o glorificar a Deus resultará num tipo de
religião falsamente mística ou emocional.”
Corremos o risco, diariamente, de vivermos para nossa
própria glória. Se isso realmente acontecer com o povo de Deus, o sentido da
vida já não estará mais diante dele. Teremos perdido tudo o que possuímos de
mais valioso. A ideia de que devemos buscar, como nosso fim supremo a nossa
felicidade é falsa, é estranha às Escrituras, pois todas as coisas foram feitas
por Deus para Sua própria glória.
Se eu e você entendemos para que fomos criados para a glória
de Deus, por que motivo vivemos como se esse propósito não existisse? Por que
motivo vivemos uma vida desregrada, com propósitos materialistas, mundanos?
Será que Deus se gradaria de seres que não O tem como principal em suas vidas?
Será que essas pessoas podem ser tidas como filhos de Deus? A resposta é
negativa. Seus filhos viverão para Sua glória, não para a glória deles mesmos.
E nada farão por obrigação, como se estivessem sendo levados a fazer algo que
não passa de um fardo. Antes, com todo amor e gratidão, Seus filhos não farão
nada nesse mundo que não seja com o fim de glorificar a Deus!
A verdadeira felicidade está em Cristo. A verdadeira
satisfação e gozo para o verdadeiro cristão não estará apenas em receber
gratuitamente paz, alegria, abundância ou qualquer outro bem das mãos de Deus,
mas, sobretudo, em glorificá-Lo. A glória de Deus deve ser a maior ambição do
ser humano!
Soli Deo Gloria. Somente a Deus a glória!
Bibliografia:
Rafael Augusto
Site: https://www.jovemreformado.com.br/2016/12/28/fomos-criados-para-a-gloria-de-deus/#comment-25735
REFERÊNCIAS:
[1] – Santo Agostinho, in: “Confissões” (São Paulo: Paulus,
1997 – Coleção Patrística), p.19.
[2] – William Hendriksen, in: “Comentário do Novo Testamento
– Romanos” (São Paulo: Cultura Cristã, 2011), p.496.
[3] – João Calvino, in: “Série Comentários Bíblicos –
Romanos” (São Paulo: Editora Fiel, 2014), p.480.
[4] – João Calvino, in: “Série Comentários Bíblicos –
Evangelho Segundo João” vol.2 (São Paulo: Editora Fiel, 2015), p.204.
[5] – Johannes Geerhardus Vos, in: “Catecismo Maior de
Westminster Comentado” (Recife: Os Puritanos, 2015), p.32.
Com Amor... Pr. Alecs Ferreira!!!